A ocupação política da Telebras
Estatal que depende de recursos públicos reserva quase 20% de seus cargos para indicação de apadrinhados políticos como resultado de acordos de Lula com o Centrão de Alcolumbre
O aumento de quase 58% no número de cargos por indicação política na Telebras, já aprovado por conselhos e comitês internos da estatal, é o espelho da degradação política de um governo fraco, porém obstinado em se manter no poder. Como mostrou o Estadão, está em gestação o aumento dos cargos comissionados de 56 para 88, nos quais serão abrigados apadrinhados e parentes de políticos do Centrão, que já domina a Telebras.
O clima de vale-tudo em uma trama tão explícita comprova que a busca por apoio político a Lula da Silva na campanha de 2026 está a pleno vapor. Acordos que, na verdade, começaram a ser costurados ainda em 2023. Antes mesmo de ocupar a presidência do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) obteve do Planalto o salvo-conduto das indicações para a estatal, vinculada ao Ministério das Comunicações, que também está em sua área de influência.
Deficitária, a Telebras é uma das estatais classificadas como dependentes do Tesouro Nacional, ou seja, precisa do dinheiro arrecadado do contribuinte para sobreviver. E é com esses recursos que o governo deve contar para bancar o custo extra de R$ 12,3 milhões com os novos cargos, cujos titulares vão receber salário em torno de R$ 30 mil mensais. Entre eles, como mostrou a reportagem, há parentes, contraparentes e apadrinhados de políticos. Em nota, a Telebras informa que tudo isso é para fortalecer a governança da empresa, uma evidente afronta à inteligência alheia.
Até o final dos anos 1990, a Telebras operava o monopólio da União nas telecomunicações, que respondia pela telefonia fixa, a incipiente rede celular e transmissão de dados. Com a privatização do sistema, ficou inativa por mais de uma década até ser reativada em 2010 – não por coincidência também num governo de Lula da Silva, o segundo mandato do PT, partido que capitaneou uma verdadeira guerra contra a privatização da empresa, em 1998. Lula ressuscitou a Telebras para gerir o Programa Nacional de Banda Larga (PNBL), que tinha metas específicas de universalização do acesso à internet e redução de preços.
O fato de as metas não terem sido cumpridas parece ser, na visão lulopetista, um mero detalhe. Dilma Rousseff sucedeu a Lula, obviamente, com a mesma linha de atuação e somente em 2017, no governo Michel Temer, quando os cargos comissionados já somavam 76, foi elaborado um cronograma de redução para eliminar 50 deles até 2020. Em 2019, chegaram a ser reduzidos a 51, até que o então presidente, Jair Bolsonaro, pediu adiamento do prazo para 2023, sob o argumento de que o Programa Nacional de Desestatização, no qual a empresa foi inserida, exigia “perfis profissionais”, um paradoxo diante de ocupação político-partidária da estatal.
De volta à Presidência, Lula da Silva, além de descartar a privatização, dizendo que nada mais seria privatizado no País, tratou de ampliar novamente os cargos de barganha da Telebras, desta vez para 56, sem encontrar resistências. Agora, com a proposta de subir para quase 90 o batalhão de indicados políticos, a Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Sest), que controla recursos e dispêndios das estatais, classificou a medida como “temerária”, mas ficou por isso mesmo.
Um parecer técnico da Sest, de caráter apenas consultivo, alerta que com o aumento os funcionários comissionados representarão quase um quinto (19%) do quadro total de funcionários da estatal, cerca de quatro vezes a média das empresas sob alçada da administração federal.
A ocupação política da Telebras é tão preocupante quanto suas dificuldades financeiras. Em 2024, o prejuízo líquido da empresa, de R$ 252,1 milhões, foi mais do que o dobro do registrado em 2023, e a estatal admitiu ao Tribunal de Contas da União ter feito uma “pedalada fiscal” de R$ 77 milhões, rolando despesas de 2023 para 2024. No Congresso, um projeto enviado em 2024 pelo Executivo tenta mudar as regras de contabilização de empresas que, como a Telebras, dependem do Tesouro. O Planalto, espertamente, quer que passem do orçamento fiscal para o orçamento de investimento. Melhor seria chamar de “orçamento de campanha eleitoral”.
Editorial Estadão