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Editorial Estadão: Supremo instaura terra sem lei na internet

Supremo instaura terra sem lei na internet
Ao fabricar regras arbitrárias para redes, STF institucionaliza o caos que pretendia regular e atropela o Legislativo, o único Poder com legitimidade para criar limites na internet

Formou-se, no Supremo Tribunal Federal, a maioria de votos para derrubar o artigo 19 do Marco Civil da Internet – e, com ele, o delicado equilíbrio jurídico que sustenta há uma década a liberdade de expressão no ambiente digital. Como sempre, os ministros discursaram em nome da democracia. Mas, ao substituir a lei pela vontade de togados e ao instituir um sistema de censura privatizada baseado em critérios nebulosos e voluntaristas, é exatamente essa democracia que estão dilapidando – e com zelo quase missionário.

A regra consagrada no artigo 19 é simples e civilizada: plataformas digitais só podem ser responsabilizadas por conteúdo de terceiros se, após ordem judicial, se recusarem a removê-lo. Essa exigência serve a um propósito elementar do Estado de Direito: impedir que empresas privadas se transformem em tribunal de exceção, garantindo que as liberdades de se manifestar não se submetam ao arbítrio corporativo nem ao linchamento militante. Protegem-se, com ela, a palavra, o processo legal e a previsibilidade jurídica.

A nova jurisprudência mina esses pilares até a raiz. Cada ministro agora propõe um modelo próprio de “responsabilização proativa” das plataformas. Isso significa que elas terão de julgar e excluir conteúdos sob pena de sanção – às cegas, às pressas e por instinto de autopreservação. Em certos casos, nem sequer será necessária notificação. Em outros, bastará o impulso do ofendido, mesmo que movido por má-fé ou cálculo político. Criou-se, em nome do “dever de cuidado”, um ambiente ideal para a censura terceirizada.

O que se descreve como “precaução” é, na verdade, coerção. Diante do risco de responsabilização, as plataformas não hesitarão em remover preventivamente qualquer conteúdo remotamente polêmico. E, como os ministros empregam critérios vaporosos como “desinformação”, “discursos de ódio” ou “ataques à democracia”, o resultado é um sistema opaco, arbitrário e coator – um regime em que calar é mais seguro que arriscar. O que era para ser exceção torna-se regra. A consequência não será outra senão paranoia e asfixia do debate público.

Ao contrário do que alguns ministros sugerem, nem mesmo os regulamentos europeus – usados como biombo de credibilidade – impõem tanto. A Lei de Serviços Digitais da União Europeia tem parâmetros objetivos, foi votada pelo Parlamento e aprovada com transparência. Aqui, o Supremo legisla e decide por decreto não só o conteúdo das regras, mas quem deve fiscalizá-las: Procuradoria-Geral da República, Conselho Nacional de Justiça, uma autarquia a ser criada, alguma entidade privada ou qualquer outro arremedo de “Grande Irmão” a ser parido nas entranhas da Corte. Obviamente, tamanha interferência na vida de todos os cidadãos brasileiros não poderia ser decidida por um colegiado de 11 ministros não eleitos, somente pelos representantes do povo no Congresso.

Nada disso impede os arautos da toga de se apresentarem como redentores da República. Um ministro se declara regularmente parte de uma “vanguarda iluminista”. Outro afirmou que os ministros são “editores de um país inteiro”. Há, ainda, quem fale em “recivilização do País” – como se o povo fosse uma turba bárbara e o Supremo, sua instância catequizadora. E, para coroar, houve um ministro que comentou, em tom cândido, que todos ali no plenário eram “admiradores do regime chinês”. A julgar pela decisão do Supremo, nem precisava.

O Brasil torna-se, assim, uma aberração normativa: o único país democrático onde as normas para a internet, e até o órgão de fiscalização, nascem de sentenças judiciais. A internet nunca foi “terra sem lei”. Agora, será uma anarquia sem legislador, perpetuamente ameaçada pelas intuições draconianas de um tipo bastardo de soberano: o juiz legislador e censor. A liberdade, nesse arranjo, é pervertida em licença condicional, sempre à mercê do algoritmo nervoso ou do ministro zeloso.

A democracia que os ministros dizem proteger não precisa de intérpretes com delírios fundacionais. Precisa de instituições que se respeitem e de liberdades que não se ajoelhem. Precisa que os juízes se recordem de um princípio elementar: que quem interpreta a lei não a escreve. E precisa de um Congresso que faça valer o mandato que lhe foi dado pelo povo.

Opinião do Estadão

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