Governos estaduais devem combater crimes em serviços de segurança
Não faltam leis para punir violência e extorsão praticadas no aquecido mercado de vigilância privada
Num país com elevados índices de violência, é natural que haja grande demanda por serviços de segurança. Numa estimativa conservadora, existe 1,2 milhão de vigilantes em atividade no país, mais da metade atuando de forma ilegal. Com o controle público frágil, cresce o número de crimes envolvendo empresas do segmento. Por isso é preciso uma reação imediata por parte dos governos estaduais.
Não faltam leis para punições por extorsão, agressão ou atuação de policiais ou seus laranjas em atividades privadas. O que falta é ação. É do conhecimento público que, mesmo sendo irregular, muitos policiais têm dois empregos. A maioria faz “bicos” para reforçar os vencimentos. Alguns abrem empresas em nome de laranjas. Em 2022, seguranças que agrediram dois suspeitos de tentar furtar pacotes de carne em um supermercado da rede Unisuper, em Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre, eram da Glock, registrada no nome da mulher de um policial militar.
Há também casos em que a atividade da empresa não é aquela em que atua na verdade. Em uma operação policial realizada no início da semana em São Paulo contra a atuação do Primeiro Comando da Capital (PCC) na Cracolândia, um dos alvos era o ex-guarda civil metropolitano Elisson de Assis, dono da Law e Force, que tinha entre suas atividades o “monitoramento de sistemas de segurança eletrônica”. O que ela fazia mesmo era vender segurança para comerciantes do centro de São Paulo e praticar extorsões.
Outro episódio que reflete os problemas dessa atividade é o da morte de João Alberto Silveira Freitas, espancado por seguranças de uma loja da rede de supermercados Carrefour, há três anos e meio, em Porto Alegre. A Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores (Fenavist) atestou que a empresa contratada estava regular. Mas não os dois seguranças que mataram Silveira Freitas. Um era PM, que fazia um bico, e o outro estava com a documentação profissional vencida.
Em artigo publicado em 2015, Cleber Lopes, professor de ciências sociais da Universidade Estadual de Londrina, mostra que, na cidade de São Paulo, seguranças irregulares se envolviam, em média, em 41 ocorrências criminais por mês. Entre os seguranças regulares, a média era menor, 12.
Está em debate no Congresso a criação do Estatuto da Segurança Privada. O texto em discussão veda a prestação do serviço de forma cooperada ou autônoma e reforça o papel da Polícia Federal no controle e fiscalização da atividade. Embora a versão final do projeto possa trazer avanços, é um erro achar que toda e qualquer melhoria depende de sua aprovação. Com certeza, a Law e Force não é a única empresa irregular a extorquir em São Paulo. O mesmo acontece nas demais capitais. Governos estaduais têm todas as condições de atacar o problema. Não apenas mandando investigar crimes, mas coibindo a segunda jornada de policiais.
Editorial O Globo