O engenheiro civil e mecânico Carlos Magno Soares Teixeira apresentou uma sugestão interessante: construir de forms emergencial um muro de contenção ao redor do Morro do Careca, para impedir o processo erosivo.
Para defender a tese, o profissional enviou o seguinte artigo:
"O Morro do Careca, uma das principais atrações turísticas do Rio Grande do Norte, está passando por um processo de erosão acelerado, que está dando origem à formação de uma falésia em sua base.
O fenômeno é relativamente recente, mas o ritmo de aumento da exposição da Formação Barreiras (sobre a qual a duna está assentada) e da perda da camada de areia que a recobre vêm preocupando autoridades, entidades do setor de turismo e a população em geral.
Caso a situação não seja revertida, ou ao menos controlada, existe a possibilidade de desabamento de grande parte da estrutura do Morro, resultando na perda de um elemento inestimável da paisagem da Praia de Ponta Negra.
2. Processo erosivo de falésias
A erosão costeira é resultado natural da degradação do material da costa pela ação dos ventos e, principalmente, das ondas, que possuem um elevado poder de destruição. Os problemas decorrentes desse processo são ainda agravados pela falta de planejamento do uso do solo e também pela elevação do nível do mar.
A linha de costa do Nordeste Brasileiro é formada por falésias pertencentes à Formação Barreiras, tipo de formação que é extremamente modificada pela erosão costeira.
Para o litoral do Nordeste, a situação representa uma grande preocupação, considerando que a maior parte de sua população vive nessa área, onde se concentram muitas atividades econômicas, obras e investimentos, com destaque para o setor do turismo.
A elaboração da presente proposta foi baseada em consulta bibliográfica sobre os riscos representados pelo avanço do mar e a erosão de falésias, incluindo trabalhos sobre as praias de Pipa, Tabatinga e Ponta Negra, no Rio Grande do Norte, e Cabo Branco, na Paraíba, entre outros.
A pesquisa incluiu também diversas reportagens em jornais, blogs e sites locais sobre o tema, sobre vistorias e relatórios realizados pelos técnicos da SEMURB, IDEMA, IBAMA e Defesa Civil.
3. Caracterização da situação da praia de Ponta Negra
O processo de erosão do Morro do Careca está inserido em fenômeno global, de avanço do mar sobre as áreas costeiras de todo o planeta. Em nível local, o fenômeno ameaça não apenas o Morro do Careca, mas também grande parte da praia de Ponta Negra, cujo calçadão vem sofrendo, a cada ano, maiores impactos das ondas do mar.
A situação já é conhecida, e as soluções para seu controle já estão previstas. A prefeitura de Natal contratou um projeto de enrocamento e engorda da praia de Ponta Negra, cujo objetivo é proteger a orla e alargar sua faixa de areia.
A primeira etapa do projeto já está em execução, com a instalação de blocos de concreto para proteção do calçadão.
Após a conclusão do enrocamento, deverá ter início a etapa de engorda da praia.
O grande complicador da situação é que a etapa de enrocamento tem duração prevista de 10 meses. E que até lá, a base do Morro do Careca continuará a sofrer os impactos das ondas do mar, o que poderá resultar na aceleração do aumento da erosão, da exposição da formação Barreiras e da perda da camada de areia da duna que a recobre.
4. Hipótese para o surgimento da falésia no Morro do Careca
Desde o início do período de ocupação da praia de Ponta Negra por moradores, frequentadores locais e turistas, muito antes do surgimento da falésia vista atualmente na base do Morro do Careca, era possível observar uma camada de areia que recobria uniformemente toda a sua encosta, e se estendia até a faixa de praia.
Nos períodos de maré alta as ondas atingiam e arrastavam essa base de areia, mas esta era reposta naturalmente pelas camadas de areia mais altas, desde o topo do Morro, pela ação do vento e da gravidade, em um processo de arraste e reposição contínuos.
Durante várias décadas os frequentadores da praia subiam o Morro do Careca, como forma de lazer, atividade física e contemplação da paisagem. Com o passar do tempo, o grande número de pessoas subindo e descendo a encosta da duna provocou um alargamento de sua faixa desmatada, o que obrigou as autoridades a interditar o acesso ao local, no ano de 1989. Com esta medida, o ritmo do processo de erosão da duna diminuiu, embora nunca tenha sido definitivamente controlado.
Nos últimos anos, no entanto, o perceptível avanço do mar e o impacto das ondas sobre a base do Morro provocaram um desequilíbrio no ciclo contínuo de arraste e reposição de areia, resultando na formação da falésia vista atualmente.
Nestas condições, a camada de areia normalmente existente na base da duna não foi mais reposta no mesmo ritmo do seu arraste pelas ondas. A camada de areia que recobria as encostas superiores do Morro, por sua vez, não encontrando resistência em sua base, passou a deslizar naturalmente pela borda da parede vertical que surgiu na base da falésia, deixando a Formação Barreiras cada vez mais exposta e sujeita aos impactos das ondas, do vento e das chuvas, acelerando o processo erosivo.
As imagens registradas pelo autor desta proposta, no dia 01/05/2023, corroboram a hipótese para o surgimento da falésia. Nestas imagens, pode-se observar um novo foco de erosão acentuada no Morro, a uma altura entre aproximadamente 10 m e 15 m.
Nas imagens também é possível observar que a faixa central do Morro apresenta menos sinais de erosão que suas faixas laterais. A explicação para esta diferença parece ser a camada de areia remanescente na base do Morro, em sua faixa central. Esta camada aparentemente diminui o deslizamento das camadas de areia que recobrem as encostas superiores da falésia, reduzindo a intensidade da erosão. Nas faixas laterais, onde não mais se observa a presença da base de areia, o ritmo da erosão se mostra muito mais acentuado.
Resumidamente, os estudos consultados e as observações realizadas neste trabalho permitem levantar a seguinte hipótese para a erosão do Morro do Careca:
O avanço do mar e o impacto das ondas sobre a base do Morro do Careca provocaram um desequilíbrio no ciclo de arraste e reposição das camadas de areia, deixando a formação Barreiras descoberta e propiciando a formação de um paredão vertical em sua base.
O surgimento desse paredão acelerou o deslizamento das camadas de areia que recobriam as encostas mais altas do Morro.
Sem a proteção natural destas camadas de areia, o processo erosivo causado pela ação das ondas, pelo vento e pelas chuvas vem deixando a formação Barreiras cada vez mais exposta, acelerando ainda mais o ritmo da erosão nas partes mais elevadas do Morro.
Caso este cenário persista, existe grande possibilidade de surgimento de novos paredões verticais nas camadas superiores do Morro, que podem resultar na formação de uma grande falésia, semelhante às existentes nas praias de Cotovelo e Pipa.
5. Proposta para contenção da erosão do Morro
A solução óbvia para o problema da erosão do Morro do Careca parece ser:
Proteger a base da falésia do impacto das ondas
Evitar ou diminuir o ritmo de deslizamento das camadas de areia que recobrem as encostas da duna.
Pelos sinais perceptíveis de evolução da erosão do Morro, considera-se temerário aguardar o final da etapa de enrocamento e o início da etapa de engorda da praia.
Diante do que foi observado e diagnosticado, a solução emergencial proposta para a situação é instalar uma camada de enrocamento ao longo do perímetro da base do Morro, a uma altura superior à do paredão vertical formado pela erosão.
Espera-se que esse arranjo proporcione uma proteção à base da duna contra o impacto das ondas, além de promover a recomposição da lâmina de areia que recobre toda a sua encosta, como acontecia em sua configuração original, antes do início do processo erosivo.
Existem diversas tecnologias de enrocamento para proteção costeira. Para o manejo de dunas, especialistas recomendam o uso de estruturas flexíveis ou naturais, como bolsas de geotêxteis, cercas e plantação de vegetação.
A questão que se mostra urgente é que estes sistemas podem demorar a ser instalados. Enquanto isso, a aceleração do processo erosivo e a ruptura de novos trechos da base do morro podem aumentar a altura do paredão vertical. Ou podem propiciar o surgimento de novos trechos verticais nas camadas mais altas do Morro, formando uma sucessão de novos paredões verticais, o que poderia inviabilizar definitivamente qualquer tentativa de evitar a formação de uma grande falésia no lugar atualmente ocupado pelo Morro do Careca.
A proposta sugerida por este trabalho, portanto, é aproveitar o sistema de blocos de concreto que está sendo usado para a proteção do calçadão da praia.
A sugestão é construir uma camada de enrocamento ao longo de todo o perímetro da base do morro, com uma altura aproximadamente 0,50 m (50 centímetros) a 1,00 m acima da altura do paredão vertical formado atualmente.
Esta camada de enrocamento teria dupla função – proteger a base do morro do impacto das ondas e conter a areia que desce de suas camadas mais altas.
A adoção desta solução depende, naturalmente, de uma consulta à empresa responsável pela execução da obra de enrocamento do calçadão, para dimensionamento de cargas, empuxos, drenagem pluvial e estabilidade estrutural,
O sistema já foi utilizado e apresentou resultado positivo na contenção da erosão do terreno do Hotel Imirá, localizado na Via Costeira, conforme mostram as imagens a seguir:
6. Impactos e resultados esperados
A solução proposta certamente representará um custo complementar ao contrato de fabricação e instalação dos blocos de concreto, exigindo possivelmente um aditivo a este contrato.
No entanto, considerando que a estrutura de produção dos blocos já está instalada e em plena operação; e que a instalação dos blocos no calçadão também está em plena execução, a construção do enrocamento da base do Morro poderia ser realizada rapidamente, bastando remanejar provisoriamente a quantidade de blocos necessários e as equipes de execução.
Espera-se que, pouco tempo após a instalação dos blocos de enrocamento, a camada de areia que tradicionalmente recobria a Formação Barreiras venha a ser recuperada, evitando a propagação da erosão em suas camadas superiores e a formação de novos paredões verticais.
Um eventual impacto visual da instalação dos blocos na base do Morro pode certamente ser considerado muito menos significativo que o impacto da formação de uma falésia em seu lugar. Além disso, possivelmente estes blocos virão a ser totalmente recobertos pela camada de areia com o passar do tempo.
Não é possível afirmar com certeza que a proposta resolverá o problema da erosão do Morro do Careca, que envolve ações de intemperismo sobre estruturas geológicas relativamente frágeis. Mas diante do risco iminente de perda desse importantíssimo elemento paisagístico para o turismo do Rio Grande do Norte, acredita-se que vale a pena adotar uma medida ativa de proteção contra a erosão, em vez de aguardar que a situação se estabilize naturalmente até a execução da engorda da praia."