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O Cancelamento. O linchamento 

Autor: Thiago Medeiros; Publicitário e Sociólogo.  

Hoje podemos afirmar que a cultura do cancelamento tem chamado a atenção, principalmente nas redes sociais, por tratar-se de uma onda que incentiva pessoas a deixarem de apoiar determinadas personalidades ou empresas, públicas ou não, que podem ser do meio artístico ou não, em razão de erro ou conduta “reprovável”, segundo julgamento do inquisidor. Nos termos da definição dessa palavra "cancelar", a ideia desse movimento é literalmente "eliminar" e "tornar sem efeito" o alvo do cancelamento.

Algo que precisa ser esclarecido sobre a cultura do cancelamento é que ao contrário do Direito onda há um devido processo legal para justificar uma punição ou não, o "tribunal da Internet" não costuma oportunizar sequer o exercício do contraditório. Na maioria das vezes, observamos que a pena é executada imediatamente e a onda de boicotes tem início tão logo o erro ou conduta dissonante são notados e expostos. Tal imediatismo é resultado principalmente da polarização, mostra como estamos intolerantes e cria um ambiente onde a sanção antecede a defesa. Dessa forma, o universo virtual torna-se hostil, seletivo e, por vezes, injusto.

Pode-se perceber que, a partir da constatação de erro ou conduta reprovável por um grupo de pessoas, cria-se um movimento na rede social de exposição para que, não somente os usuários deixem de "seguir" a pessoa ou de comprar determinada marca, por exemplo, mas também para que parem de dar visibilidade ao trabalho de alguém ou determinada empresa, nesse momento cada um age de forma a ser um “juiz”, funciona como um ator moral do mundo virtual. Esse ataque pode ser sentido em todas as áreas, e o reflexo de tal atitude avança do mundo digital para o real. 

Essa vigilância do discurso, daquilo que é falado ou praticado pode provocar uma tendência ao silêncio referente a assuntos perigosos, que podem gerar interpretações que não sejam unanimidade. Quase que uma espiral do silêncio, onde tudo gira em torno de assuntos que agradem à maioria. 

Existem vários tipos de cancelamento. O primeiro advém de pessoas que sempre foram canceladas durante sua vida, que nunca tiveram vez, não participam dos espaços públicos, foram excluídas, não tiveram acesso à cultura, educação, ou seja, elas vivem a vida em estado de cancelamento. Muitos então enxergaram na rede, uma nova forma de participar de grupos de afinidades e interesses, onde podem se colocar e ter alguma espécie de voz e por uma tendência humana estarão prontos para cancelar assim que for preciso.

O segundo tipo de cancelamento é o vínculo que vai se estabelecendo entre as pessoas que são assinantes de um canal, que segue um influenciador. Aquelas pessoas que estão “seguindo” fazem uma espécie de investimento, porque a figura que seguimos representa uma forma de vida, uma forma de articular desejo, vida e trabalho, na qual eu me vejo expresso nele. Esse investimento presume fidelidade, que o influenciador irá se manter congruente com aquelas identificações.

Porém minhas identificações são múltiplas e quando eu escolhi, por alguma afinidade, seguir uma determinada pessoa, muita coisa do seu caráter ou comportamento será escondida. Geramos algumas expectativas, mas o meio virtual e também o real sobre o influenciador acaba por mostrar outras faces, outros comportamentos que revelam uma outra pessoa diferente da que resolvemos seguir.  E quando isso acontece, a sensação gerada é a de uma traição e, devido a isso, o influenciador é cancelado, excluído. Este é como um investimento que agora não traz mais rentabilidade, e seus rentistas irão sacar o dinheiro investido, no fundo eles detém o poder. 

Quando você transforma sua vida em objetivo de venda, quando você transforma seu dia a dia em objeto nas redes sociais, você está se expondo à cultura do cancelamento. Tudo tem seu ônus e seu bônus. 

A cultura do cancelamento tem que vir com o valor do ato do reconhecimento. Quando ela é evocada, precisa ser feita de maneira brutal pois demonstra que eu estou acima daquele que amava e tenho o poder de julgá-lo, e o cancelamento também pode vir com o efeito manada, posso excluir somente porque aquele investimento já não tem valor para os outros, e eu preciso fazer parte daquilo, participar do linchamento, isso me traz prazer. 

O cancelamento explicita a espetacularização da vida nos meios virtuais, tanto por parte da figura pública quanto por parte de seus seguidores e isso acaba por ser preocupante ao ponto que alguns cancelamentos podem ser feitos de maneira “armada”, “criada” por alguém ou grupo que tenha interesse em cancelar aquela empresa ou pessoa. O efeito que é provocado gera uma irracionalização do ato, que não mede as consequências, nem ao menos tem o poder de calcular quem poderia estar ganhando com aquele cancelamento.

Apesar de alguns defenderem que o ato de cancelar, de se vingar, de linchar seja antigo e natural do ser humano, precisamos parar e avaliar nossas atitudes, sejam elas no mundo real ou no mundo virtual. Podemos assim afirmar que a cultura do cancelamento é um equívoco, na medida em que a mesma acaba por não permitir justamente o livre debate de ideias e a circulação de opiniões distintas, algo saudável para a democracia.

 

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