Um grupo de estudantes de medicina assinou uma carta aberta endereçada ao Governo do Estado e Prefeitura de Natal e em determinado trecho falam em “prejuízos irreparáveis para a formação dos estudantes”.
Abaixo a íntegra do documento:
CARTA ABERTA DOS ESTUDANTES DO CURSO DE MEDICINA - UFRN
Natal, 31 de março de 2021
Excelentíssimos Governadora do Estado do Rio Grande do Norte, Vice Governador, Prefeito da Cidade de Natal, Vice Prefeita e Secretários de Saúde,
A pandemia do Covid-19 surpreendeu e afetou todo o mundo, nos âmbitos mais diversos, em especial na saúde. A gestão de tamanha crise é, de longe, um dos maiores desafios impostos aos nossos governantes nos últimos tempos.
Medidas rígidas, como o isolamento social, são necessárias e entendemos o quão dificultoso é impor os protocolos adequados.
Abordando, agora, especificamente a saúde, evidenciamos que a pandemia em questão fez a sociedade voltar seus olhos a essa esfera, em especial, aos profissionais que arduamente trabalham por ela. Tidos como “heróis”, os trabalhadores da saúde receberam inúmeras homenagens pelos serviços prestados.
No entanto, se por um lado esses foram exaltados, a realidade dos estudantes da saúde é divergente da responsabilidade que os espera.
Apesar da louvável conquista em tornar os alunos das áreas da saúde em estágio técnico (internato) como “essenciais”, os alunos de períodos anteriores - e edificantes na formação Médica - foram proibidos de frequentar os cenários de práticas, tendo essas migrado, em sua maioria, para o formato remoto.
Essa adaptação trouxe prejuízos irreparáveis para a formação dos estudantes, que viram amplamente reduzido um pilar essencial da saúde: o contato com o paciente.
Essa conexão é importante no exercício de várias habilidades indispensáveis, como a realização de anamnese, exame físico, elaboração de raciocínio clínico, entre outras.
O comprometimento da lapidação dessas habilidades pode acabar por trazer prejuízos irreparáveis às práticas dos futuros médicos que estão submetidos a tais condições inadequadas de formação.
Além do déficit incontestável que acompanha a ausência de atividades práticas, é importante mencionar que, com a suspensão de tais momentos, os ambulatórios destinados aos estudantes do ciclo clínico são reduzidos ou, até mesmo, temporariamente interrompidos.
As consequências disso são vários pacientes com atendimento retardado ou até perdendo seguimento clínico por um período considerável de tempo.
Logo, é natural concluir que a suspensão das aulas presenciais também afeta diretamente a população, já tão privada de atendimento médico especializado.
Por tudo mencionado acima, apelamos aos nossos governantes que permitam-nos uma formação de qualidade. Temos ciência da responsabilidade que carregamos ao entrar no curso de Medicina e queremos fazer jus à confiança que nos vai ser depositada por cada futuro paciente.
Complementarmente, faz-se importante enfatizar que, se as aulas mantiverem-se interrompidas, o atraso na formatura das futuras turmas é quase certo e a necessária inserção de médicos nos nossos serviços de saúde pode acabar sendo comprometida.
Para embasar nosso pedido, realizamos uma pesquisa entre os estudantes do 1º ao 8º períodos do curso de Medicina, solicitando resposta sobre infecção pelo COVID- 19 no período em que as atividades práticas estavam liberadas.
Nossas respostas foram como o esperado para uma população comprometida com os protocolos de segurança: durante todo o intervalo de tempo de aulas presenciais, apenas 9 dos 263 alunos entrevistados afirmaram ter contraído o COVID-19.
Os demais estudantes que referenciaram infecção (41 indivíduos) adquiriram o vírus quando não estavam em aula presencial. Esses dados apontam para a segurança de nos manter nos ambientes de prática e ressalta como nós respeitamos as normas de segurança vigentes.
Complementando o tópico acima, é válido mencionar a modificação no modelo das aulas presenciais: onde, anteriormente, cerca de 10 alunos ocupavam um mesmo ambiente de atendimento, hoje, apenas 1 ou 2, a depender do rodízio, dividem o mesmo espaço.
Isso é possível devido às escalas montadas pelos departamentos e, com certeza, também contribuiu bastante para os baixíssimos números de contaminação. Quanto às aulas teóricas, todas estão no modelo remoto de ensino e acreditamos que o mais prudente é que continuem assim enquanto for conveniente.
Outro ponto relevante é que os alunos comprometem-se a arcar com seus próprios equipamentos de proteção individual (EPIs), especialmente máscaras (cirúrgicas, N95, PFF2) e, inclusive, houve demonstração de disponibilidade em auxiliar, financeiramente, os que não tivessem como custear tais itens. Com essa informação, pretendemos demonstrar que não somos uma população que onera os serviços em que somos inseridos.
Todavia, cabe elencar que a Universidade disponibilizou-se, também, para fornecer os EPIs aos alunos, quando necessário.
Finalizamos essa carta convidando nossos representantes a analisar criticamente todas as informações aqui expostas e, com o uso do bom senso, permitir que nós retornemos ao nosso ambiente de estudo.
Nós seremos os futuros profissionais da saúde que, inclusive, atenderão vocês, seus filhos e parentes. Queremos, indubitavelmente, oferecer qualidade, mas precisamos de ferramentas para que isso seja possível.
Para tanto, solicitamos que em próximos decretos seja permitida a realização de atividades práticas presenciais para todos os alunos do curso, e não somente para os períodos de estágio técnico.
Atenciosamente,
Gabriel Paula Leite Müller, coordenador geral do centro acadêmico de medicina da UFRN - Natal (CANECA)
Antonio Carlos de Morais Neto, coordenador geral do centro acadêmico de medicina da UFRN - Natal (CANECA)
Laura Luísa de Carvalho Cruz, representante do 8° período
Letícia Morais de Andrade, representante do 7º período
Iana Fernanda de Medeiros Cabral, representante do 7º período
Ramon Suassuna Barreto Sotero Rosa, representante do 6º período
Francisco Victor da Silva Oliveira, representante do 5° período
Clara Alice Lima Leal, representante do 4º período
Camila Gasparini Maciel Diógenes de Abreu, representante do 3º período
Gabrielle Karla de Oliveira Dantas, representante do 2º período
Nathália Raggi Periard, representante do 1° período